quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Diferença e Repetição

Lembrava-me a bruma e as coisas escondidas. O frio e o casaco vermelho cheio de joaninhas bordadas escondidas.

Os sapatos bonitinhos. As marias-chiquinhas e as bonecas - as mesmas.

A mão forte, grande e enorme, com veias altas, que segurava minha e me levava para passear.

E o passeio em uma floresta de árvores imensas, que escondiam o céu, palmeiras, eucaliptos, muita sombra e o barulho da natureza.

De repente, uma trilha, um caminho pequeno de terra.

- Vamos ver se tem amoras?

A mão forte se separava da minha, com um sorriso no rosto.

Abaixava-se e ficava mais perto de mim e ficava do meu tamanho.

Logo duas mãos fortes se esticavam na minha direção repletas de amoras roxas, vermelhas, rosas, doces e gostosas.

Há pouco tempo estive nesse mesmo lugar, mas sem as mãos fortes para me oferecer algo doce e gostoso.

Era de manhãzinha e as mesmas brumas estavam ali. O mesmo barulho e as mesmas árvores.

A saudade era grande e comecei a chorar. Pai.

Coloquei as mãos no chão e disse àquela que me desse força para continuar a viver e a ser.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

A Bailarina Torta

Não acontecia apenas com ela, mas uma série de outras pessoas que ainda ficavam caladas. Sabiam dançar muito bem na ponta dos pés, mas quando chegava alguém, um movimento desconcertante acontecia, de repende um desequilíbrio inesperado e caía ao chão.

Como os amigos viam apenas ela, e não costumavam olhar para o modo como eles mesmos dançavam, chamavam-na de a "baliarina torta" remetendo à imagem que tinham na mente, ao contemplar a dança, a torsão e finalmente o tombo.

Mas a bailarina não se importava muito com as quedas, para ela, o mais importante era mesmo dançar. Ainda que de maneira retorcida, ainda que de modo desconcertante para quem via, ainda depois da queda... ao dançar, ela só sentia a sensação do vento nos cabelos soltos, os pés se mexendo e os braços em movimentos lânguidos, sem nunca parar.

Por isso, nunca passou pela sua cabecinha a sensação que os outros tinham de que a sua dança era um constrangimento. Pois, os defeitos aconteciam apenas para quem via e de vez em quando, quando chegava alguém.

Em seu mundo, sozinha, a bailaria torta não via ninugém, apenas sentia o corpo fluindo, numa imensidão azul e eterna.