sábado, 26 de julho de 2008

Direto das Colinas de Bunker Hill

" Tinha que pensar. Não ajoelhei; sentei e fiquei olhando as vagas comendo a praia. Isso é ruim, Arturo. Você leu Nietzsche, leu Voltaire, você devia saber. Mas raciocinar não ia resolver nada. Eu podia morrer de raciocinar, mas raciocinar não estava no meu sangue. Era meu sangue que me mantinha vivo, sangue fluindo através de mim, me dizendo que estava errado. Fiquei sentado lá e me entreguei ao meu sangue, deixando que ele me carregasse nadando de volta aos fundos oceanos dos meus primórdios." (FANTE, 1987: 100).




FANTE, John.(1987) Pergunte ao pó. 3.ed. Trad. Paulo Leminski. São Paulo: Brasiliense.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

A tarde leve

O céu dourado, o silêncio, as àrvores quietas, o descanso.

A música doce, a música fluindo baixinha, quase um sussurro.

As roupas pingando no varal.

O cheiro do pão fresco vindo da padaria.

- Vovó!

E céu vai ficando mais vermelho, mais escuro e o tempo mais frio...

Os telhados das casas úmidos: as portas vão se fechando.

Cheiro de café.

- O que eu acho?

Acho que eu merecia ser uma coisa melhor do que sou, algo mais eu, assim a tarde fica mais leve, fica mais minha.

Num silêncio, numa quietude infinita, que me diz quem eu sou.

Contos de Fadas para Mulheres do Séc. XXI

'Conto de Fadas para Mulheres do Século 21'

Era uma vez, numa terra muito distante, uma linda princesa,
independente e cheia de auto-estima que, enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo estava de acordo com as conformidades ecológicas, se deparou com uma rã.
Então, a rã pulou para o seu colo e disse:
Linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Mas, uma bruxa má lançou-me um encanto e eu transformei-me nesta rã asquerosa. Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir um lar feliz no teu lindo castelo. A minha mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavarias
as minhas roupas, criarias os nossos filhos e viveríamos felizes para sempre...
E então, naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã à sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria e pensava:
"Nem fo...den...do!".
(Luís Fernando Veríssimo).

Enviado pelo meu admirado ex-marido: Naná!

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Pergunte ao Pó

"Outro dia, poesia!


Escreva um poema pra ela, derrame o coração em doces cadências; mas eu não sabia fazer poesia. Comigo era amor e flor, rimas, péssimas, sentimentos banais. Oh Meu Jesus, não sou escritor coisa nenhuma: não consigo nem criar uma quadrinha, eu não presto pra nada. Parei na frente da janela e levantei as mãos para o céu; bom pra nada, só uma farsa barata; nem escritor nem amante; nem carne nem peixe.


Mas qual era o problema?"


FANTE, John.(1983) Pergunte ao pó. Trad. Paulo Leminski.3 ed. São Paulo: Brasiliense.